quarta-feira, 11 de novembro de 2009

em algum lugar do passado


Hoje eu caminhava sem rumo certo, atrás de carimbos lusitanos que comprovassem minha residência na nobre freguesia de Cedofeita. Caminhava em vão, diga-se de passagem, porque todos tem uma desculpa para a pobre estrangeirinha que à toa se embucha de bolinhos, na tentativa de ganhar a simpatia dos lojistas. Sigo meu rumo, os passos pesarosos, olho uma que outra vitrine e lá está, na "montra" sorrindo. Olho para ele, ele olha para mim, aquele enternecimento súbito, amor a primeira vista, fetiche do consumo. Entro na lojinha e, como não poderia deixar de ser, aguardo que o velhinho mais empoeirado que os livros das estantes se digne a me atender. Digo que queria dar uma olhada nos estojos e ele os coloca em cima do balcão. Toco nas latas frias, cheias de lembranças quentes e aquareláveis, em todas as nuances de cor. O preço, porém, é dos mais amargos, e mal começou novembro, e há muitas viagens previstas, e não posso sair assim a gastar como a perdulária que sou. A tentação é terrível, concluo que vale a pena, tudo vale a pena, se a alma não é pequena, já dizia o poeta. Mas depois me recordo que não há razão para tão desmedida compra, se não desenho já faz tanto tempo, se já nem sei mais o que desenhar, se acho que nem sei mais desenhar, se parece que tudo isso já acabou, que passou o tempo e o vento levou.

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